Do alto do Cerro...

...seculos de história indígena te contemplam e, ele, Nheçu, foi um dos primeiros líderes a perceber os problemas que a aculturação branca trazia para o continente de Nuestra America del Sur!

sábado, 4 de setembro de 2010

Livros impressos nas Missões

Uma falta de aprofundamento do que foi realmente a vida nas reduções jesuiticas, está contida na afirmação de que nelas não existiam livros!
Ora, o padre João de Castilho foi aprisionado pelos guarani quando estava lendo um livro de rezas, em 1628 e, o padre Roque Gonzales teria, contam por aí, traduzido para o idioma guarani o catecismo, nos seus tempos de Assunção do Paraguai!
Neste sentido, muito interessante é a entrevista de Kollontai Diniz com Fernanda Verísimo, realizada para o portal Brasiliana, acerca da Imprensa Jesuitítca-Guarani no Paraguai. Fernanda é jornalista e doutoranda em História Moderna e Contemporânea pela universidade de Sorbone, Parias (França).
A entrevista ocorreu pelo fato de que a Brasiliana da Universidade de São Paulo - USP, digitalizou dois livros das missões jesuitícas do Paraguai: Arte de la lengua guarani, de Antonio Ruiz de Montoya e o Explicacion de el catechismo en lengua guarani, de Nicolas Yapuguay, ambos impressos em 1724 no Pueblo de Santa Maria La Mayor, sendo livros muito raros e parte do que restou da produção de livros nas missões jesuíticas no Paraguai, que chegou a existir no período de 1700 a 1727.
Para se ter uma idéia da tremenda riqueza que representam estes livros, o Diferencia entre lo temporal y eterno, impresso em 1705, trazendo 43 gravuras, do qual só existem dois exemplares do mundo, localizados na Argentina, já teve proposta de compra (recusada pelo colecionador!) numa oferta superior a dois milhões de euros!
Pequeno trecho do livro, para se ver o idioma espanhol antigo e algumas palavras impressas em guarani, que era essecialmente oral:
Che (claYflarnidó á álgun Indio. Es ssmhien* parti -
cuta de quien fe rouéftra medio enfadji,JE. G- dice
uno: (cmondo V*gayaha) y Rcfpi el erro: (che)no
te liras urjpoeo.de pacicneiávy lodlce coa algún
tonillo/ « ‘ ‘
Cheay paco! Intericc. del que fe.duele.” Ay dérfti*
Caí (ola)’amando a’ocre y es Iaceriec. del que haíe
filencio oronuncíidó con vez baats’.
Chuira) lo mefmo que: (guara) T©biíchua ] p©r (Tobaigaa)
Obs. - tive acesso aos dois livros graças a divulgação da Biblioteca Digital Curt Nimuendaju. (JWG).

Salto Pirapó abrigou a primeira indústria da região!

Por João Weber Griebeler
O Sr. Aldino Spohr nos informa que no local em que foram encontradas as pontas de flechas indígenas, se encontravam também jogadas uma infinidade de outras pontas, levando a supor que o Salto Pirapó, devido à farta pesca, era um local de morada da tribo, época em que se fabricavam as pontas de flecha, sendo por isso, um rico sítio arqueológico.
Observa ele que as pontas de flecha que havia por ali, tinham alguma forma de imperfeição, tendo sido descartadas para constituir uma boa e certeira flecha.
Levando-se em consideração a importância de um local para a confecção de armamentos para as tribos guarani, se convenciona que o Salto Pirapó, formava com o Cerro do Inhacurutum (ponto regional de observação), um conjunto que mantinha o aparato bélico e estratégico de Nheçu.
Confirmando esta afirmativa, quem dirigir seu olhar para o Cerro do Inhacurutum, desde o Salto Pirapó, a partir do início da baixada do Passo São João, verá todo o esplendor do cerro, dominado a região, dando para imaginar um sistema de sinais de fumaça para sinalizar o ingresso de barcos inimigos através do Rio Ijuí, via Rio Uruguai.
Para ilustrar melhor essas considerações, vejam que de um lado haviam os domínios nheçuanos e, do outro, rodeando e penetrando a região como ponta de lança, a redução de São Nicolau, a Redução de Caaró e, por fim, a Redução de Assunção do Ijuí, aí Nheçu reagiu, martirizando os padres, em 1628!

As inverdades das Missões

Um dos percalços de quem procura divulgar Nheçu e a Primeira Fase das Missões (1610-1637)refere-se ao dualismo histórico entre esta, realizada sob domínio espanhol e a Segunda Fase (1682-1767), já sob domínio luso.
Tenho aqui comigo guardado um recorte do jornal Zero Hora, do dia 06/06/1988, páginas centrais do 2 caderno, onde se relta das comemorações dos 300 anos das Missões, que, sob este prima, teria seu início ocorrido somente em 1682!
O interessante é a entrevista com o cineasta Sylvio Back, catarinense de Blumenau, que entre outros filmes, produziu “República Guarani” (1982), na qual ele diz que - as reduções tem transmitido uma idéia ingênua da existência de um pacto social e espiritual entre jesuíta e néofito (índio), e nisto teria residido sua longevidade. Segundo o cineasta, o universo catequético que iniciou com os padres jesuítas ampliou-se ao infinito. (...). “A Igreja Católica, que continua embalada pela mesma estratégia de ocupação ideológica da mente do indígena, agora está disputando clientela com dezenas de outras religiões, seitas e quetais, sob a mesma cumplicidade do estado. Não é sem razão que, sintomaticamente, o indígena continua encontra-se mais sitiado do que há 300/400 anos”, conclui Back.
Falso conhecimento das Missões
Uma falta de aprofundamento do que foi realmente a vida nas reduções jesuiticas, está contida na afirmação de que nelas não existiam livros!
Ora, o padre João de Castilho foi aprisionado pelos guarani quando estava lendo um livro de rezas, em 1628 e, o padre Roque Gonzales teria, contam por aí, traduzido para o idioma guarani o catecismo, nos seus tempos de Assunção do Paraguai!
Neste sentido, também muito interessante é a entrevista de Kollontai Diniz feita com Fernanda Verísimo, realizada para o portal Brasiliana, acerca da “Imprensa Jesuitítca-Guarani no Paraguai”. Fernanda é jornalista e doutoranda em História Moderna e Contemporânea pela universidade de Sorbone, de Parias (França).
A entrevista ocorreu pelo fato de que a Brasiliana da Universidade de Sao Paulo - USP, digitalizou dois livros das missões jesuitícas do Paraguai: Arte de la lengua guarani, de Antonio Ruiz de Montoya e o Explicacion de el catechismo en lengua guarani, de Nicolas Yapuguay, ambos impressos em 1724 no Pueblo de Santa Maria La Mayor, sendo livros muito raros, parte do que restou da produção de livros nas missões jesuíticas no Paraguai, que chegou a existir no período de 1700 a 1727.
Estes livros trazem o emblema do fato de terem sido as primeira manisfestações do vocabulário das línguas indígenas que até então não tinham sido escritas.
Para se ter uma idéia da tremenda riqueza que representam estes livros, o Diferencia entre lo temporal y eterno, impresso em 1705, trazendo 43 gravuras, do qual só existem dois exemplares do mundo, localizados na Argentina, já teve proposta de compra (recusada pelo colecionador!) numa oferta superior a dois milhões de euros!
Obs. - tive acesso aos dois livros graças a divulgação da Biblioteca Digital Curt Nimuendaju. (JWG).

A lenda da erva mate

Publicada tempos atrás no antigo jornal do Correio do Povo, de Porto Alegre, a Lenda da Erva Mate foi republicada pelo Jornal Folha da Produção, de Cerro Largo, dia 20/07/1995, na coluna do Professor José Reichert.(JWG).

A lenda da Erva-Mate
A erva-mate já era conhecida e aproveitada pelos Guaranis que habitavam na região sul Brasil. O termo Guarani era CAA-YARI, o que significa: sumo de erva mate (chimarrão) J.Palma da Silva, publicou, há bastante tempo, no Correio do Povo, a lenda da erva mate, Ei-la.
A lenda da erva-mate guarda em sua seiva os elementos que outrora animaram o corpo da formosa índia guarani, tenra e delicada, de nome Yari. Por essa razão quem toma chimarrão , absorve com o sabor da erva, a própria alma encantada de Yari, filha de um valente chefe Guarani. Segundo a lenda foi há muitíssimos anos antes do homem branco pôr os pés nas terras da América que teve origem o miraculoso vegetal que hoje medra e enriquece muitos municípios dos Estados Sulinos do Brasil, mormente o Rio Grande do Sul, deliciando o paladar de muita gente.
O alvorecer de certo dia fora o mais belo da nova e tépida estação das flores e dos frutos. Quando o sol espargiu sobre a mata gaucha seus primeiros resplendores, a orquestra da passarada, saudando a aurora, foi abafada pelo brado imenso da aguerrida tribo guarani que se punha em marcha. A comando do novo cacique, partia ela em busca de novas paragens, impulsionada pelo instinto errante arraigado no sangue da raça guaranitica. Todos os membros da tribo homens, mulheres, adolescentes e crianças, sentiam-se eufóricos, na expectativa de sempre novas aventuras.
Na taba abandonada, somente um único rancho continuou habitado; aquele do antigo cacique, quebrado dos anos, e que não mais tinha condições de seguir com a tribo que por longos e longos anos comandara. Somente a filha mais jovem do ancião, a formosa Yari, rejeitando a corte de muitos valentes guerreiros guaranis, resolveu permanecer junto ao alquebrado cacique-pai. Boa filha quis ela ficar junto do pai, para ampará-lo na amarga decrepitude do resto de sua vida.
Sentado a porta do rancho o velho seguia, com vista cansada a tribo distanciar-se mais e mais, na lonjura das coxilhas. Vieram à lembrança as inúmeras andanças que chefiara a frente de seu povo. Recordou como, então todos os seus admiravam a sua habilidade no manejo do arco, a bravura com que sempre enfrentara os combates, e a nobreza com que sempre tratara os prisioneiros e hospedes.
De repente o velho guerreiro reclinou a cabeça que sempre mantivera erguida, escondendo-a nas mãos , e as lagrimas quentes da saudade umedeceram-lhe pela primeira vez, a face sulcada, como as bossorocas do chão nativo. Quando enfim, ergueu o rosto, com o peito mais desoprimido viu diante de si um jovem de aspecto estranho. Não era ele de nenhuma das terras conhecidas. Tinha o jovem a pele alva e os olhos da cor do céu. Era lindo o manto que revestia.
Tratando de cumprir os seus deveres de hospitalidade, chamou yari. Fez o viajante adentrar seu rancho, oferecendo a rede para repousar. Sem demora a moça serviu o mel mais saboroso das mirins e os frutos mais gostosos, recém colhidos.
O sol subiu, declinou no arco da tarde, a poucas braças do horizonte. Foi quando o jovem anunciou que iria partir. Instado a que pernoitasse mesmo porque seria temeridade enfrentar a noite, o visitante revelou sua condição de enviado de Tupã, o Deus do Bem preferindo estas palavras “Sou portador de uma graça para ti e todos os da tua raça. especialmente para aqueles que, como tu, chegou a idade da solidão e da saudade. Vou agraciar tua linda filha com uma árvore que se multiplicará, cobrindo todas as matas de tua terra. Quem sorver a seiva do novo vegetal, sentirá o coração rejuvenescido e vibrar com as mesmas virtudes que animaram a alma pura e delicada de Yari”.
E os dois guaranis, pai e filha, viram surgir um misterioso esplendor do sol, a primeira planta de erva-mate.
Já se afastava o enviado de tupã, quando voltou se disse: “Yari, doravante serás a deusa dos ervais, a CAA-Yari. E teu belo corpo, e esse teu sorriso nunca mais serão vistos pelos mortais, exceto por teu velho pai e por algum ervateiro digno do teu amor”.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Guerreiro das sendas (I)

Por João Weber Griebeler
Ao procurarmos destrinchar os primórdios da História da nossa região missioneira da época do grande cacique Nheçu, devemos nos ater para a herança genética que nos legou a Civilização Guarani de 1626.
Esclarecedoras pinceladas a esse respeito nos repassa o pesquisador paraguaio Bartolomeu Meliá, profundo conhecedor in loco da cultura guarani desde o ano de 1969, período em que foi conviver com estes nossos irmãos de região.
Segundo Meliá, o guarani - nome que significa guerreiro -, é um notório caminhante (sendas e trilhas na mata), girando em torno de sua aldeia para armar arapucas dedicadas à caça de animais, busca de favos de mel, colheita da mandioca, enquanto toca flauta.
Esse seu gosto pelo som, aliás, foi um dos atrativos para levá-los à domesticação, empreendido pelas reduções jesuíticas.
Mais ainda, por ser uma civilização de cultura essencialmente oral, as palavras ditas tem o poder de lei para os guarani.
Por aí, chegamos ao seu idioma. A linguagem conhecida guarani remonta há cerca de 3.000 anos antes de nossa era, mas a origem desse tronco fonético Tupi-Guarani retroage a mais de 5.000 anos.
Existem cerca de oito famílias do idioma, ramificadas em outras 28!
O Povo Mbyá, do qual originou Nheçu, se esparramava numa vasta região que incluía a Argentina, o Brasil e o Paraguai.
Essa grande diversidade dialetal, em que são reconhecidos pelo menos seis idiomas, se deve ao já citado hábito de caminhante do povo guarani, que se afastava para outros rincões da mata, onde havia mais abundancia de comida, sendo a imensa “nação” guarani um resultado desses meios de vida.
A comida era uma preocupação tão grande entre esse povo que a primeira palavra guarani registrada em idioma castelhano foi “avati” (milho) por Diego García, em uma carta de 1530.

Bartolomeu Meliá estará na Unisinos, em São Leopoldo, dia 26 de outubro de 2010, durante o 12 Simpósio Internacional – A Experiência Missioneira: território, cultura e identidade, onde ministrará a palestra A cosmologia indígena e a religião cristã: encontros e desencontro de universos simbólicos.

Nheçu existiu realmente?

Diferente da busca dos relatos bíblicos de Jesus Cristo, que procuram comprovar sua efetiva existência, a busca dos dados históricos de Nheçu é mais fácil devido aos avanços da civilização em face dos livros e arquivos em poder de instituições da Espanha e da Igreja Católica (1).

Assim, Nheçu entrou para a história já nos primeiros relatos elaborados pelos jesuítas, contemporâneos dele, como o padre Antônio Ruiz de Montoya, em seu livro de título quilométrico: Conquista Espiritual, feita pelos Religiosas da Companhia de Jesus nas Províncias de Paraguai, Paraná, Uruguai e Tape, de 1639 (a 2a edição saiu em 1892, sempre no idioma espanhol antigo), além das Cartas Anuas, que eram o relatório anual das atividades realizadas por cada sacerdote jesuíta e remetida para sua congregação, a Companhia de Jesus.
Comentando a ação de Nheçu, Montoya, em esclarecedoras palavras, conta do clima de animosidade existente entre os padres e Nheçu e, também, a importância deste chefe tribal: “Morava por aqueles contornos (o Cerro do Inhacurutum) o maior dos caciques que aqueles “países” (2) conheceram. Faziam-no respeitado as suas artimanhas, embustes e magias, com as quais enganava aquela gente bárbara. Chamava-se ele Nheçu (!): o que quer dizer “Reverência”.
Em diversas versões da história do Rio Grande do Sul, Nheçu passou a ser citado por alguns historiadores, a partir do livro de Carlos Teschauer, História do Rio Grande do Sul dos dois primeiros séculos.
Acontece, porém, que este livro, numa série de três volumes, foi editado apenas uma vez, nos anos de 1918, 1921 e 1922, respectivamente, ficando a partir de então, restrito às bibliotecas que por ventura o possuíssem, somente voltando a ser reeditado no ano de 2002 pela Editora da Unisinos, com uma “transcrição com atualização ortográfica e tradução vernácula”, algo polêmica, feita pelo jesuíta Arthur Rabuske.
Entretanto, será de forma mais recente e massiva que Nheçu irá aparecer com mais força, isso ocorrendo a partir do livro de Ruy Nedel, Esta Terra Teve Dono, lançado em 1983, além de Barbosa Lessa com Nheçu - no corredor central (1999), ABC do Tradicionalismo Gaúcho, onde Salvador Lamberty chama Nheçu de Palanque da Resistência Americana - “Nheçu, que muitos chamam de feiticeiro, foi o verdadeiro líder do povo indígena. Quem defendeu a nação do Tape. Sepe Tiaraju foi o símbolo da coragem de um povo aculturado. Nheçu foi o símbolo de um povo que pereceu apegado a seus princípios, defendendo sua Nação - !”, Sergio Venturini com Inhacurutum e as Missões Jesuíticas (2000) e outros autores, assim como as iniciativas efetuadas por pessoas oriundas da comunidade de Roque Gonzales (3), como as crônicas de Nelson Hoffmann, publicadas ao longo dos anos e reunidas no livro Terra de Nheçu (2006), a formação da Associação Cultural Nheçuana (2009) e a disseminação de artigos e matérias na rede mundial de computadores, a internet, em espaços criados em cima destes fatos e, para saber a extensão disso, bastando digitar a palavra NHEÇU no seu computador!
NOTAS:
(1) Carlos Teschauer, alemão, autor da História do Rio Grande do Sul dos Dois Primeiros Séculos, obra em três volumes, cuja montagem durou 10 anos e contou com viagens a Buenos Aires, Rio de Janeiro e consultas a arquivos em Roma, Bruxelas, Espanha e Portugal, entre outras cidades.
(2) “Países” porque toda essa vasta região pertencia à Espanha!
(3) O primeiro conto de JWG, História Guarani publicado na antologia CONTOS DO BRASIL CONTEMPORÂNEO (1997), de forma ficcional, traz a lume as disputas de credos e crenças entre Nheçu e um índio e sua família, recém-convertidos ao catolicismo.

O eterno Bombeador da história!

Por João Weber Griebeler – HISTORIADOR
Enquanto se procura arranjar atrações turísticas para Roque Gonzales, temos aqui algo único e de alcance mundial, que é a historia de Nheçu, legada para nós desde 1628 e que nunca obteve qualquer benefício de apoio e divulgação de parte dos poderes constituídos!
A sina de Nheçu parece ser a de viver à parte da história oficial, por ser autêntico e defender seus pontos de vista, ser para sempre um eterno “Bombeador” lá do Cerro do Inhacurutum.
Nheçu somente será mais conhecido quando a comunidade assumir essa divulgação como um todo engajado, quando percebermos que temos essa imensa riqueza adormecida, escondida onde outrora eram matas repletas de vida, bichos e de nascentes d´águas límpidas, onde a Natureza era respeitada, sem o uso de pesticidas e de secantes do verde, pois Nheçu, e todos os índios, sabiam que para viver, tinham de manter a Natureza Viva...
Agora Nheçu vem sendo muito lembrado, está adquirindo status de galã, mas houve épocas em que isso era diferente, período em que defender um índio era alguma coisa de impensável. Recordo de certo episódio acontecido, onde se “repartiu” a história da 1a Fase das Missões (1610-1637) e disseram para mim: “Você fica com os bugres e eu fico com os padres”!
Pois, com muita honra e sobriedade, eu continuo “pensando” como índio, para poder escrever com fundamento.
Aliás, falando nessa história recente, observem determinadas pessoas que se fizeram presentes na constituição da Associação Nheçuana, também elas, particularmente, ou suas famílias, foram artífices da construção e edificação do Santuário de Assunção do Ijuí a partir de 1988, em honra a um dos Três Mártires das Missões, o padre jesuíta João de Castilho, martirizado pelos aliados de Nheçu, a mando do cacique.
Isso se pode considerar um avanço, num sinal dos tempos com a mudança dos costumes, valorizando a autenticidade de Nheçu em defesa de seus direitos à vida tribal, em face de outros costumes!
Considerando que essa é a nossa possibilidade de sobressair ao mundo com algo único, com verdadeiro interesse turístico e cultural, voltamos a falar de Nheçu nesta edição, assim iremos falar de Nheçu e, voltaremos a falar de Nheçu!

Por breves momentos, a Terra sem Males!

Por João Weber Griebeler
Missões Jesuítico-Guaranis, livro mais recente do Bispo Emérito, Dom Estanislau Kreutz, que por longos anos administrou os paroquianos da Diocese Angepolitana e agora , como escritor, lança obra histórica, trazendo a lume, diversos aspectos novos para quem se dedica ao estudo da História Missioneira!
Uma curiosidade é que os pesquisadores católicos, não fazem citação de textos de qualquer autor, este tem que merecer credibilidade perante o clero, para ser referência. Na bibliografia dos livros utilizados para escrever este obra, diversos autores não comparecem, talvez por fazer conjeturas não confirmadas.
As novas informações são, na maior dos casos, oriundas do livro Misiones y sus pueblos de Guaranies, de Guliullermo Furlong, publicado na cidade argentina de Posadas, Misiones, no ano da graça de 1979, com 788 páginas, sendo este o mais citado.
O livro traz uma ordenada síntese histórica das Missões, seu cotidiano, ideal para estudantes de todas as idades. Um ABC enxuto, vivaz, com os dados novos já referidos. Exemplo: muitos padres jesuítas eram boticários ou farmacêuticos, além de médicos-cirurgiões, pois para se embrenhar na mata cerrada, cumpria ter um mínimo de assistência da saúde. Um dos motivos da quebra do sistema de reduções foi que após a expulsão dos jesuítas, estas ficaram sem assistência médica.
Voltando à análise de Missões Jesuítico-Guaranis, vejo que a busca de uma TERRA SEM MALES na terra vinha através das escolas, que existiam em todas as reduções, onde os jovens curumins recebiam instrução, com enfoque na música, sendo que a conquista da terra indômita foi realizada ao som de muitas melodias, não esquecendo que o sino das reduções foi uma novidade que atraia e, ao mesmo tempo, causava temor. Um cristão neófito não devia viver longe de seu campanário!
Segundo Dom Estanislau: “Os índios eram lentos no serviço, conversadores e matistas.” (Tomadores de chimarrão, a erva mate). Havia uma metódica distribuição de tarefas. Ignácio de Loyola, fundador dos Jesuítas era militar, daí o senso de organização da Ordem Religiosa que ele reuniu em torno de si.
Assim, “duzentos índios ocupavam-se em cada redução com a criação de gado. Cem se prestavam a espantar as caturritas daninhas na plantação. Os ervais contavam com o trabalho de quinhentos e mil índios. Havia que limpar a terra, cultivá-la e, em tempo de seca, regar os ervais.” Aqui há um dado interessante, pois as Missões, hoje, quase não produzem mais erva mate. Será por este pequeno detalhe da laboriosa irrigação que os indígenas faziam em tempos de estiagem?
Como Pastor, esclarecedor é o apanhado que o Bispo faz da atual situação das paróquias católicas das Missões, que, em síntese, são a presença física que restou das antigas reduções missioneiras em nossa região.
Para adquirir o livro, contatar à Livraria da Cúria Diocesana ou à sua paróquia, que é onde adquiri o meu exemplar.
Tel: (55) 3313-5263, com Marlene.

Procurando vestígios

Por João Weber Griebeler
Antigamente, as estradas eram formadas pelos rios, os verdadeiros caminhos por onde se deslizava em canoas com a força dos remos. Assim, o Rio Ijuí pertencia a uma rota percorrida pelas tribos guarani mbya.
Como a denominação de Pirapó quer dizer “lugar onde o peixe salta”, o local era uma parada obrigatória na migração indígena.
O traçado de navegação indígena tem importantes conexões com o Rio Uruguai, com o Paraguai, local de origem desta etnia. Foi este um dos caminhos mais percorridos pelos primeiros padres jesuítas quando aqui estiveram em 1626 e 1628, Roque Gonzales, João de Castilho e Afonso Rodrigues.
Estes locais de parada serviam para descanso da tribo, assim como em épocas da pesca ser farta. Para os índios, não existia a escravidão do relógio e do calendário. Viajava-se quando dava vontade, dormia-se onde podia abrigar-se das feras à noite, onde a comida se mostrasse e, nesse particular, o Lugar Onde o Peixe Salta, as quedas do Salto Pirapó, era uma excelente pedida!
O fogo já era conhecido pelos indígenas, porém a forma como serviam suas panelas para cozer os alimentos não era como a conhecida maneira de pendurar a panela por sobre a fogueira, já que um objeto de argila aquecido não suportaria ficar suspenso. Dessa forma, aquecia-se uma pedra no fogo e jogava-se dentro da panela!
Nos informa o historiador argentino, Alejandro Larguía, de Posadas: “Sem dúvida, houve assentamentos dos guaranis em toda área das bacias dos rios Ijuí, Piratini e Camaqua, bem provado está pela fundação de São Nicolau de Piratini pelo santo Roque Gonzalez com cola-boração dos caciques guaranis, amigos de Nicolas Ñenguiru o primeiro cacique convertido da banda oeste do rio Uruguai. Toda a banda oriental do rio Uruguai tinha muitos assentamentos guaranis até o rio Ibicui, perto de Itaqui.”
Na sexta-feira, 30/11, encontramos o Sr Albano Caye junto a Pedra Fundamental e ele reanimou aquela conversa existente sobre a descoberta de uma panela indígena ali nas proximidades, esta panela de argila teria vindo a superfície partida pelo arado conduzido por seu filho Ademar Caye, que fez o achado ao arar a terra para plantio da lavoura.
Nos dirigimos à Assessora de Imprensa da Eletrosul, Adriana Haas, que nos encaminhou para a bióloga Juliana Felden, a qual marcou uma visita de reconhecimento com o Sr Albano Caye para demarcar a área de um possível sítio arqueológico e encaminhar pedido da vinda de arqueólogos para pesquisar na referida área, que pertence à Eletrosul.
Poderá se estar assistindo a um embrionário museu indígena, com achados referentes ao 1o Ciclo das Missões (1626-1637), algo que nem São Miguel das Missões possui, por pertencer ao 2o Ciclo das Missões (1682-1767)!
Trata-se de um potencial de riqueza turística fenomenal, por inexistir algo que se enquadre a isso!
O sítio arqueológico em questão, nos informa também o Sr Aldino Spohr, com que quem fizemos matéria no mês de maio, sobre sua coleção de pontas de flecha de Pedra Lascada, fica junto ao capão de mato, que ainda existe, em área da usina a ser preservada, a cerca de 200 metros de onde foi lançada a Pedra Fundamental na sexta-feira, 30 de novembro. .

Sitio arqueológico em Roque Gonzales

Por João Weber Griebeler
Certa feita, foi me repassado um recado, “em curva”, quando comentei aqui no Jornal Igaçaba, meses atrás, sobre a existência de sítio arqueológico no Salto Pirapó, sob pena, ressalvaram, de que essa descoberta fosse interromper os trabalhos de construção da Usina Salto São João.
As descobertas de vestígios dos guarani que aqui transitaram é coisa comprovada!
As pontas de flechas, por exemplo. Calcula-se que elas eram fabricadas por caçadores colhedores de alimentos e, isto teria começado a ocorrer a partir do ano 7 mil a. C. , ou seja 9.000 atrás, estando aí algo a ser comprovado pela datação histórica dos objetos encontrados por meio de Carbono 14, ou outros tipos de medição temporal, pois se calcula que a nação guarani teria começado a se manifestar a uns 3 mil anos atrás.

Pontas de flechas, encontradas por Aldino Spohr nas margens do Rio Ijuí, no Salto Pirapó, próximas das cachoeiras do Salto, sendo esta uma característica de se descobri-las nas margens de arroios e rios com cachoeiras, provando ser o Salto Pirapó, “lugar onde o peixe salta”, um local regional para abastecer as tribos com carne de peixe.
Segundo avaliações, as pontas de flecha seriam de pedras diferentes daquelas existentes no leito do Rio Ijuí, tendo vindo parar ali pelo uso de flechas na pesca dos peixes, quando subiam o rio.
O índio ficava de espera e, quando surgia um peixe grande, disparava a flecha, ou lança, fisgando o incauto!
As pontas de flecha começaram a ser utilizadas por caçadores no período Neolítico, ou cerca de 4 mil anos a. C!
Boleadeiras e Machadinha, depositadas na Lancheria Dani, foram reunidas por Iraci Luft, após serem encontradas na antiga propriedade de seu pai, Aldino Luft, no Salto Pirapó, a cerca de 1 quilômetro da margem do Rio Ijuí. Também acompanhava o conjunto cacos de cerâmica e a área em torno dessa descoberta, formava um solo de coloração diferente (barro preto), num círculo de cerca de 20 m2, mostrando que o local se destinava a produção de objetos de barro cozido.

Panela e Machadinha – o presidente da Associação Nheçuana, Giani Schmidt da Silva, entrevistou Ademar Caye e esposa, antigos moradores do Salto Pirapó, sobre o encontro de vestígios de panelas e uma machadinha indígena guarani. Notem o trabalhado da face externa da panela, sendo no interior liso, para cozinhar alimentos.
O Rio Uruguai, que se interliga com o Rio Ijuí, no Distrito de Rincão Vermelho, na Barra do Ijuí, é depositário de muitos vestígios arqueológicos importantes na margem castelhana, como Garruchos e Santo Tomé, entre outros locais, comprovando o transito das tribos indígenas por barco no decorrer dos séculos.
MAIS VESTÍGIOS - As boleadeiras eram utilizadas para caçar, derrubando os animais em fuga.
A machadinha era escavada na rocha, com fio próprio para cortar, utilizadas na caça e nas lutas com tribos inimigas.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Aqui era a terra de Nheçu

Séculos se passaram e a nossa verdadeira história está ressurgindo…Foram idéias esparsas, recolhidas ao longo das estradas, que vieram nos falando de vozes e cantos em liberdade, vivendo em plena harmonia com a mãe-natureza, respeitando povos e culturas diferentes, sem impingir a mácula do pecado das cruzes e da ganância das riquezas dos paraísos.Estes ideais podem estar assim ressurgindo, recuperando a verdadeira história do Cacique Nheçu e sua tribo guarani-mbya, através de livros, documentários e DVDs, filmagens de curta, média e até longa metragem!Uma realidade que poderá ser possível a partir apenas de Roque Gonzales…e para tanto, Giani Schmidt da Silva (Payador), João Weber Griebeler, Adriano Reisdorfer, Nelson Hoffmann e Marco Marques (Colelo) estão trabalhando. (JWG).

Missões: história e mitos

Vou citar alguns exemplos, que estão aqui, ao nosso lado, em Roque Gonzales. O conhecimento existente é meio que utópico, ufanista, oriundo de teorias livrescas, sem atinar com a geografia e a realidade do local, caso do Cerro do Inhacurutum, onde se apregoa que o Cacique Nheçu, “vivia” no cerro, local que possuiria “750” metros de altura, etc. e tal. Bom, como chefe indígena respeitado que era, Nheçu possuía enorme clã familiar, com cerca de 30 esposas e como todo esse parentesco de sogros e sogras, cunhados e cunhados, tios, primos, crianças, avós e etc., não poderia, obviamente, habitar uma diminuta e estreita superfície como é o ápice do Cerro do Inhacurutum, por isso, tinha de se localizar a aldeia na base do morro, e em todos os arredores. Em relação à altura do Inhacurutum, considerada como o ponto mais alto das Missões, haveria de se descontar o nível do mar dessa altitude, outros, porém, que cansaram de subir e descer a pé, dizem que é menos de 300 metros e, alguns, com a fita métrica na mão, juram que se medindo verticalmente, a altitude verdadeira não passa de 172 metros! Outro ponto falho, também originário de um conhecimento essencialmente livresco da história, refere-se a citação apenas do Cerro do Inhacurutum como ponto de observação dos precavidos índios guarani de Nheçu. Ora, indo ao local, percebe-se que para quem desejaria controlar o movimento de pessoas na mata, rondando o Rio Uruguai, vindas das bandas da Argentina e do Paraguai, caso do padre jesuíta Roque Gonzales, nos idos de 1620, o melhor ponto de observação seria o Serro Pelado, em Porto Xavier, com uma visão magnífica de toda nossa atual fronteira! (JWG).

O Herói Nheçu

João Weber Griebeler
Os artigos que publicamos na edição 141 do Jornal Igaçaba, deram origem a comentários e bate-papos, havendo até sugestão de se organizar uma entidade de amigos para recuperar o passado de lutas e bravura do cacique Nheçu, sempre tão esquecido, naqueles tempos idos do Rio Grande do Sul espanhol e, antes dos tempos hispânicos, do tempo Nheçuano, pois o maior líder indígena a se rebelar e perseverar na manutenção de sua cultura autóctone foi o cacique Nheçu. Aí começaram a aparecer os entraves: o nome dessa organização poderia ser “amigos de Nheçu”, no idioma guarani mbya, mas ali, não tem a denominação de “amigos”, pois quando se pensa “índio”, o imaginário se restringe a situações concretas. O índio tem um circulo familiar restrito. O “amigo”, muitas vezes, é o da onça! A palavra mais aproximada que encontramos foi a de irmão, desde que da parte da esposa. Importantes observações morfológicas dali saíram advindas: a mulher era mais importante na sociedade tribal guaranítica do que a história oficial conta - ela era, e continua sendo nos dias atuais, a pessoa que mais trabalha na família. Por isso o cacique se tornava poderoso e influente a partir do momento em que tinhas várias esposas. Irmão, portanto, valia muito e se tornava bajulado, se tinha irmãs!

Nheçuano, em vez de missioneiro...

A idéia de denominar os naturais da região missioneira de “nheçuanos” partiu do Giani Schmidt da Silva, por ser algo mais autêntico, já que Missões, assim como a espanhola Cruz Caravaca, de dois braços, seriam lembranças do domínio do império espanhol, quê, em certo período, foi absoluto em todo o mundo. Dias desses, comprovei o acerto dessa opinião, pela dificuldade da maioria das pessoas do país em dimensionar o que seria a região das Missões. Eu já tinha percebido isso em conversas com mineiros, capixabas, etc., entretanto, no dia 23/04, escutando pela internet, no computador, a rádio Antena 102 FM - 24 horas ao vivo para todo o planeta - clique para ouvir -, de Jales (SP), na região do Oeste Paulista, mandei mensagem pedindo a música “Os Amantes” com o Daniel, dizendo que era de Roque Gonzales, nas Missões, fronteira com a Argentina. Eles atenderam amavelmente e até registraram no programa sertanejo, dizendo, porém, que eu estava em Roque Gonzales, desempenhando uma “missão”! (JWG).

o que fizeram com teu povo, Tupã?

A igreja da Catedral de Santo Ângelo, uma quase réplica da de São Miguel Arcanjo, que existiu na época dos Sete Povos, é a sede atual da diocese das Missões, passando por uma longa reforma, interna e externa, que lhe tirou do interior a polêmica pintura do artista Tadeu Martins, feita na década de 1990, e que representava os índios guarani em frente ao crucifixo e os padres jesuítas. Dizem que a obra não era arte sacra para constar num altar devocional... Mas, a dita cuja ficava velada por panos durante as celebrações religiosas, para não ofender a moral por mostrar os indígenas seminus. Numa paródia, como diria o astrônomo Galileu Galilei, que teve de jurar que a terra não girava em torno do sol: “Mas as índias viviam mesmopeladas”! Na mesma seqüência de reformas no centro histórico de Santo Ângelo, a Praça Pinheiro Machado ganhou, em cada canto, uma Cruz Missioneira, aquela de dois braços, originária da Espanha como Cruz de Caravaca, para ser uma forma de “proteção”, sendo também vendida como relíquia para carregar no peito em um colar para propiciar bons eflúvios. Também serão feitas 30 colunas, simbolizando os 30 Povos, um arco, uma rosa dos ventos, ponte, pira de fogo e fonte de água, mais um relógio do sol, pedra dos desejos, uma árvore de erva mate, um anjo de bronze e um “indiozinho”, pois, também tinham índios nas reduções jesuíticas!

Antes, o mundo (e os índios) existia!

O Rio Grande do Sul teve início com a vinda do Padre Roque Gonzales, lá por 1619, quando começam a haver as primeiras tentativas de penetração do que viria a ser, futuramente, o solo gaúcho. Com um pouco de investimento em pesquisas históricas, nós podemos provar, “preto no branco”, como diriam os antigos, que o primeiro local que o homem branco colonizador (o Padre Roque) pisou no RS foi na Linha Itaquararé no Distrito do Rincão Vermelho! Basta querer demonstrar tal fato de maneira insofismavelmente, com provas históricas e, é bom que isso seja feito logo, antes que a água da barragem da Usina Binacional de Garabi, a ser construída em Garruchos, inunde o local! O Passo do Padre em São Nicolau foi palco da 1a missa em solo gaúcho, ninguém está questionando isso, mas para que tal fato ocorresse, houveram inúmeras tentativas, sempre repelidas pelos índios indômitos. Melhor dizendo, o Padre Roque Gonzales chegou a cruzar o Rio Uruguai e pisar em terras rinconenses, mas logo saiu corrido dali, devido ao fato de ser nossa região, então, um baluarte do poderoso Cacique Nheçu, privilegiado com os postos de observação do Serro Pelado (Porto Xavier), Cerro do Inhacurutum (Roque Gonzales) e Cerro do Monge, na Argentina. Aliás, é o papel guerreiro e independente dos índios guarani, ainda sem o cabresto da religião, principalmente do Cacique Nheçu, que ainda não foi devidamente dimensionado pelos arremedos e tentativas de explicar a verdadeira História das Missões. Os padres jesuítas, a serviço do reino da coroa espanhola, o mais poderoso império colonialista da época, atacaram logo a fonte do poder de influência dos caciques e pajés: a poligamia. Dizem que Nheçu tinha 30 esposas. Ora, eram também 30 famílias a pelear pelos interesses do genro e cunhado, daí o imenso alcance do clã familiar numa sociedade que não tinha dinheiro para comprar vassalos, nem cargos públicos para pendurar os aliados… Ao atacar esse modo de vida tribal primitivo, os padres jesuítas demoliam a estrutura e força política local dos autênticos líderes, como Nheçu. A Europa recém saia do período de trevas da Idade Média e ingressava, pobre e com fome, no Renascimento, que se tornava faustoso com as riquezas do ouro e da prata, roubados pela cruz e espada, aos índios nas Américas! O Giani Schmidt da Silva, também músico e irmão do Beto Gonzales, tem uma interpretação original para com a verdadeira devoção que todos os municípios das Missões prestam embevecido culto à Cruz de Caravaca, aquela que existe em todos os trevos de acessos às nossas cidades missioneiras. (JWG).

E se fosse assim?...

João Weber Griebeler
Existe na literatura uma forma da narrativa onde se explora a possibilidade de determinados acontecimentos terem se passado de forma diferente no passado, influenciando a história atual. É o fenômeno do “e se fosse assim?…” Pois, fazendo uma espécie de História Alternativa, poderíamos recontar a trajetória do cacique guarani Nheçu, depois do confronto com os indígenas cristianizados, o que foi uma chacina, em nome de Deus, e sucedeu após o martírio dos três padres jesuítas, Roque, Afonso e João, em 1628. Uma espécie de Armagedon, a batalha final da resistência ao domínio espanhol, com as forças de Nheçu, com número girando em torno de 500 guerreiros enfrentando aproximadamente 1.200 índios leais à Coroa Espanhola (veja-se a força da aculturação: jogar irmãos índios contra eles mesmos, tendo apenas como base os presentes em forma de bugigangas), pois não foi o soldado espanhol o que massacrou os índios rebelados, mas o próprio índio! Entretanto, voltando a nossa hipotética história, Nheçu em hábil manobra, ronda a aldeia de colonização espanhola, chamada de Buenos Aires, lá se enrabichando e apreendendo uma bela jovem, ofuscante como os raios do sol, que poderia ser a atriz Luana Piovani, que ficaria deslumbrada com o TERERÊ (*) de Nheçu, sorvido nas calmas tardes do verão, ouvindo o murmúrio do Regato da Coruja. Não vou desenvolver mais esta possibilidade, pois periga de gostar a até escrever um romance ficcional… (*) Chimarrão com água fria (e daí, achastes que tinha geladeira, em 1628?...).

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Memória insepulta

JWG

Sou o esqueleto tenebroso
dos bravos massacrados
na história insepulta.
Minha tribo aqui existiu.

Posso escutar os passos
da onça a nos espreitar.
Um dia veio o homem branco
Mau, feroz e matou
todos os índios.

Ficaram as glórias da conquista
na memória dos vencedores
que recordam os “selvagens” guarani!

Boletim Igaçaba no 5, outubro, 1997

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

História Guarani

João Weber Griebeler
Potí era um índio guarani que vivia próximo à recém implantada redução jesuítica de Assunção do Ijuí. Tendo aceito a catequização dos padres missionários, seus tempos de vidas nômade e errante tinha sido trocados pelo conforto e segurança que a palavra do nandejara Jesus Cristo oferecia para seguidores.
Os alvores deste amanhecer começam a desfazer a neblina e as brumas da noite. As águas do Rio Ijuí surgem límpidas a sua vista. O dia primaveril de 1628 surge então como todo o seu esplendor. Apicaçu voa e canta por sobre cáagaçu.
Nesta manhã, Potí está pensativo, a contemplar o verde das matas e os campos, aqui e acolá cultivados por seus irmãos de tribo.
Sua noitada de sono e repouso havia sido péssima, sendo causadora disso a longa conversa mantida com o cacique Nheçu, que desenrolava ao pé da fogueira até altas horas da noite. Nheçu cruzara o rio num igaratim e vieram cheio de planos e idéias, dispostos a usar de todos os argumentos para persuadir o índio que estava aceitando a doutrina cristã. Nem o canto do urutau atrapalhara, embora Potí tivesse ficado meio receoso com esse mau presságio.
Suas reminiscências ancestrais haviam sido despertadas pelas espertas palavras do cacique. Potí recordara então que o tempo de frio tinha trocado de lugar com o tempo de calor por muitas vezes desde que ele fora considerado um guerreiro valente e valoroso para a tribo. O som da inúbia não mais acariciara seus ouvidos deste aquela época e ele vivera somente para a tristeza desde então. Como ele pudera se esquecer disso?
Novamente as palavras de Nheçu retomar a sua memória e ficam ali ressonando, cadentes por demais perturbadoras.
“Onde estão as nossas tradições? A nossa gloriosa liberdade? Desde que vieram os abunas e criaram os abambae perdemos tudo. Para os guaranis, eles são mais perigosos que a boicininga. Ontem tínhamos as caçadas, comíamos a carne da capivara e do tatu. Hoje, nem temos mais o abati para saciar nossa fome. Quando nossa cunha-caraí está velha demais, já não podemos mais ter a pele macia das cunhataí para nos aquecer no inverno. Que índios ainda somos? Pois eu te digo, Potí, que estou voltando de uma conjura com os caroguaras e o destino dos abunas já está traçado!”.
Potí mergulhou em angústia profunda com reflexões. Se o causador de tantos males que estão afligindo seus irmãos de tribo é mesmo o homem branco das rezas, porque então não exterminá-lo de vez, como sugerira Nheçu em sua despedida? O abuna daquela redução é um homem só e ele, Potí, sempre fora um guerreiro acostumado com a luta e a enfrentar qualquer inimigo de peito aberto.
O choro de seu colomi soa no interior da oca. Faz dois dias que ele está dente. Não adiantara nem um pouco a vinda de Nheçu, tão famoso em curar doenças só com seu olhar poderoso. Anhá não cedera seu espaço e o estado de saúde da criança estava piorando a cada momento que passava.
Potí vivência então um drama interior, entre suas crenças reavivadas por Nheçu e por sua nova fé cristã. De um lado, sabe que sua cunha-caraí não poderá lhe pari outro colomi, também sabe que para ir ao íbaga, quando morrer, não poderá ter duas mulheres. Isso lhe explicara muito bem aquele abuna João de Castilho, pois talvez seu tupã seja mais forte que as caretas de Nheçu. A salvação de sua raça é o que mais lhe importava nesta hora. O abuna que ele pensara em matar há poucos instantes talvez venha a salvar seu colomi!.
A noite é longa. Depois do urutau, é o mbopí que sobrevoa a oca de Potí. Quando cuarahi surge no horizonte, sua cunha-caraí volta para casa com o colomi já aliviado de seus males. Tupã fora misericordioso.
Quando chega na porta da oca, ela vê confirmado todos os negros presságios, pois Potí faz no solo, prostrado, morto que fora pelo golpe dado com o igaçaba. Nheçu não perdoara a hesitação do índio. Suas pregações que cabariam por levar ao martírio aos abunas Roque Gonzales, Afonso Rodrigues e João de Castilho, não podiam ficar abrigadas em corações devotos `a fé no tupã dops brancos e por isso ordenara a execução de Potí.

GLOSSÁRIO
- abati, milho
- abambae, bem coletivo da comunidade, coisa pública.
- abuna, padres, jesuítas.
- anhá, demônio.
- Apicaçu, pomba.
- Boicininga, cascavel.
- cáaguaçu, floresta.
- caroguaras, habitantes da Redução jesuítica de Cáaró
- colomi, menino.
- cuarahi, sol
- cunhataí, moça, virgem .
- cunha-caraí, esposa.
- íbaga, céu.
- igaçaba, vaso, pote d’água
- igaratim, barco de tamanho médio, de uso dos caciques.
- inúbia, flauta, trombeta de guerra.
- mbopí, morcego.
- nandejara, nosso senhor.
- sapucaí, gritos.
- oca, choça.
- uratau, pássaro noturno, de pio lúgubre e pressago.
- tupã, deus.

Cerro do Inhacurutum

A região das Missões, no território do Estado do Rio Grande do Sul, desde a colonização pelo homem branco, foi uma área fronteiriça entre os dois impérios que comandavam o mundo da época (cerca de 1600), a Espanha e Portugal, antes de pertencer ao domínio do reinado português, ela pertencia à Coroa Espanhola, em “conquista” oficial realizada pelos padres jesuítas, da Companhia de Jesus, a partir de 1626.Vem desde essa época, a origem de expressões e culturas espanholas, como Missões, a onipresente Cruz de Caravaca (àquela de dois braços), que decoram os trevos de acesso da Região Missioneira, em prova inconteste do poderio espanhol, que em certa época, dominou o mundo…Esta situação era confirmada pelo Tratado de Tordesilhas (1494). Entretanto, essa dominação espanhola era mais teórica e até certo ponto estéril, pois não ficaram tradições e costumes, além das denominações.Mais forte eram os costumes dos primeiros senhores desta Tierra Colorada, os índios Guarani da etnia Mbya!O tempo de glória indígena foi sob o reinado do Período Nheçuano, do Cacique Nheçu.Nheçu foi o primeiro chefe indígena que ousou se opor à mudança de seus costumes ancestrais, trazida pelos padres da Companhia de Jesus, os quais, ardilosamente, buscavam enfraquecer o poderio dos caciques, simbolizado pela união com outras famílias, através dos vários casamentos do cacique com diversas esposas, dando uma prova de sua influência tribal pela união com estas famílias...As tribos Guarani variavam até um máximo de 300 índios e a de Nheçu estava baseada nas proximidades do Cerro do Inhacurutum - o arroio da coruja - (fotos), devido a exuberante mata, proximidades com o Rio Ijuí (o meio de transporte era a canoa) e ao excelente ponto de observação representado pelo Cerro, que é a maior elevação das Missões.No topo do Cerro, Nheçu postava sentinelas de aguçado olhar, que lhe informavam sobre a movimentação do invasor espanhol, em terras hoje argentinas, até que os jesuítas começaram a ultrapassar o Rio Uruguai e a invadir o Território Nheçuano…(JWG)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Localização

O Cerro do Inhacurutum se localiza no município de Roque Gonzales, a cerca de 20 km da cidade. Dentro de pesquisas que vem realizando em sucessivas escaladas ao local, o Giani (Payador) Schmidt da Silva esteve auferindo a altura do Cerro, pois o mesmo é considerado o ponto de maior elevação da região das Missões, mas esta informação vinha sendo algo polêmica, pois enquanto alguns falavam em 700 metros, outros mencionavam o desconto do nível do mar, baixando aí para 500 metros e por aí vai…
Dessa forma, o Giani, acompanhado pelo Cleiton U. Ledur, Técnico Agrícola (CREA 157495), esteve medindo via satélite a altura do Cerro e as Coordenadas Geográficas obtidas foram as seguintes:
Norte - 6898044,04 e, Este - 692124,620.
Cota ao nível do mar: 304,15 metros
Altura no local: 176,20 metros. (Dados GPS).